segunda-feira, março 05, 2007

Chanson

Quando chega a primavera
Farto-me de ti, ó fruto
Que dá esse forte galho,
Totalmente sem apuro.
Da tua casca só o veludo
Acaricia meu dedo,
Anunciando o que cedo
Em mim de grave fez agudo.

O cheiro que em ti libera
As entranhas do absoluto,
Anti-hálito do alho,
Oxigênio que mensuro.
Junto ao teu tamanho miúdo
Ouso-me julgar aedo
Quando não sou que folguedo
Pensando xadrez o teu ludo.

Tu não és maçã nem pera,
Teu nome é mais resoluto.
Não há para ti atalho,
Teu gosto é o gosto mais puro.
A exuberância de tudo
Em ti é o que dá mais medo,
Não há melado ou levedo
Que me sirvam de algum escudo.

O que foi gerado gera
Semente no corpo bruto.
Teu útero é agasalho,
Conforto, ainda que escuro.
Ver assim teu corpo desnudo
Por dentro, só é degredo,
Um bem que não me faz ledo,
Ser seco no teu ser carnudo.

Com teu estigma e antera
Curaste meu escorbuto,
Com teu único trabalho
Voltei do podre ao maduro.
O que louvo em ti, sobretudo,
É o limo no penedo,
Teu dormir, teu sorrir quedo
Teu caule no sonho que exsudo.

Longa mas tão pouca espera
Por tirar de ti o produto,
Quase me disperso e falho
Ao fazer o certo furo.
Descobre Amor o seu estudo
No aroma de seu segredo,
Pois é doce como azedo,
Tudo diz quanto mais é mudo.

Indeiscência que Irautz quer tudo,
Tua sazão chegou cedo.
Quanto mais gentil te hospedo
Mais enfermo fico e saúdo!