sexta-feira, abril 27, 2007

Sentada sobre as patas desde aquelas épocas ou datas, lembrava-se de sua casa, aberta na mata, hoje deserta. Vistosos seus olhos tinham o vigor cansado do passado, seus desejos apunhalados sob o chão das crateras, subjugadas feras. Cansada mas alerta, esperando-me na caserna dos anos dourados e quentes, quando meias-palavras eram entendidas como sementes.
Virtudes antes dela, concretas, floresciam pelas arestas. Agora, sob seu ventre, um ramo de esporas deitando mazelas, açudes estéreis horizonte afora. O dorso quieto espanta insetos em espasmos do dia qual figura vacilante, fantasma no anteparo, dragões raros de fantasia.
Quem um dia lhe sonhou estática e eterna, ou, em delírios de inverno, pôs-lhe rios entre as vértebras, quis que reis e sacerdotes a olhassem, glosassem motes pelos idos dos séculos, xeque-mate.

Eu, alheio, virava o descampado bem no meio, onde o aclive se aumentava, lugar que ainda estive quando devagar pensava nos méritos das emboscadas dos coiotes livres. Amedrontado ia, sem saber o que me estava, sem estar no que sabia. Pacientemente ao vê-la, pura esfinge, ergui a guarda, para que me confinasse o fim da tarde na areia que não tem mais face.
Levantou-se em dignado intento, fez com que o vento parasse e instou o meu pensamento. Fremente, o tempo se indagou se ainda era tempo, se ausente. Variei meu passo e percebi, no outro lado, caminho vasto entre minha vida e o triste aspecto da figura resumida.

Puras chegam para vós, nada mais vos será poupado. Eis meu corpo em chamas consumado. Cada grão nesse deserto, em vão por vós desperdiçado, um segundo na vida do sujeito antepassado. Cemitério de vossas laringes roucas, retratos de loucas mulheres apoucando-se aos pés de pragmáticos. Bile de virago varrendo os céus de vossas vilas, maná de espantalho. Rota gota de orvalho na aba dos vossos chapéus, a última à estiagem.
Aberta vagem.

O corpo ferve, a língua serve.